sábado, 22 de agosto de 2009

"se ninguém olha quando você passa, você logo acha 'Eu to carente'..."

Ontem à noite, numa parada de ônibus, participei de um desses acontecimentos engraçados das ruas... porque entre nós humanos acontece de tudo né?! E quando estamos assim, num espaço que é de todos, sempre vivemos coisas que se não são trágicas são engraçadas.

Pois bem, estava eu na parada do bus... depois das 20h sei que todo mundo tem medo de todo mundo nas ruas e que no fim de um dia duro ( pois o dia é sempre duro pra todo mundo) todos só pensam no sossego de seus lares e simpatia é uma palavra que não existe.

Eu não tenho medo... não sei se é porque nada nunca me aconteceu de grave pelos lugares que ando ou se sou uma pessoa sem precaução... não sinto medo. Também não saio por aí falando com todo mundo, claro que não! Mas a minha cabeça é menos paranóica e mais pensativa, voltada pra acontecimentos internos. Não fico olhando se o garoto do meu lado tem cara de FEBEM ou se algum homem paquerou comigo, sei lá... não reparo em nada.

Parada e ônibus para mim são lugares de pensar, de organizar minha vida... isso sempre foi estimulado em mim pelo fato do meu ônibus demorar a vida de um burro pra passar; não tenho outra coisa a fazer senão pensar mesmo. Às vezes olho algumas pessoas, somente por olhar mesmo, pra julgar um pouquinho e achar engraçado...

Nessa noite, uma dessas pessoas olhadas por mim era um homem, uma figura hilária! Ele falava muito alto e elogiava as mulheres próximas; uma ele chamou de linda, outras, sentadas do meu lado, chamou de balzaquianas, outras ele chamou de querida...

Nenhuma delas respondeu é claro, ou esboçou qualquer gesto que permitisse ver que elas viam uma pessoa falando com elas. Nem um olhar, nem um sorriso... e olhe que ele, como eu já disse, era uma figura hilária!! Era alto, devia ter uns 40 e poucos anos, careca e vestido todo de branco; de branco numa sexta-feira me fez lembrar da Sexta-feira de todos os Santos, mas a religião do cara não vem ao caso.

Enfim, ele berrava quando um ônibus parava e vinha uma pessoa correndo, berrava pra avisar qual era o ônibus parado. Eu não fico indiferente quando vejo uma criatura dessas né?! Até quero, mas não consigo. Não consigo não olhar. E eu olhei pra ele. Aí ele falou, alto como falava: “Que coisa boa, voltar pra casa mais cedo! Você também tá voltando pra casa mais cedo né?!” realmente eu estava voltando mais cedo e estava bem satisfeita com isso, fiz que sim com a cabeça junto com um sorrisinho simplório. Ele então colocou ao meu lado um pacote que tinha na mão e voltou para seu posto de avisador dos ônibus que paravam.

E eu continuei no meu posto de observadora dele e do que sua presença suscitava nas outras pessoas. E nos meus julgamentos. O que ele seria: um louco? Essa semana me deram uma definição de normal que nunca vi antes e que me pareceu a mais fiel de todas: normal é quem é capaz de trabalhar e amar. Somente.

O cara então parecia normal, pois trabalho ele aparentemente tinha, e amar ele amava, pois só uma pessoa que ama muito seu próximo pode gritar para todos ouvirem qual é o ônibus que acabou de parar.

Foi pensando nisso e achando-o engraçado que o ônibus dele chegou, ele então veio buscar a sacola que tinha deixado do meu lado e falou pra mim: “Obrigado querida, obrigado pela esmola do seu olhar...”, saiu, continuou gritando o ônibus e foi o último a subir.

Eu fiquei sem palavras.

Não sabia que um olhar poderia ser tão importante para uma pessoa assim. Deu um nó na minha garganta sabe?!

E a pergunta que não cala: o que ele seria? Ficou simplesmente sem resposta... pode ser que seja um psicopata altamente dissimulado, poder ser que seja um bandido procurado pela INTERPOL, pode ser que seja um açougueiro ou médico ou enfermeiro... ou pode ser que seja apenas uma pessoa que como todo mundo precisa do olhar do outro pra se sentir alguém...

A partir de agora, prometo que sempre vou olhar pras pessoas a minha volta.

2 comentários:

  1. Ai Marcela que texto gostoso de ler e olhe que eu prefiro textos curtos...mas o meu olhar repousou com atenção nas suas palavras.

    Bjus menina

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